sexta-feira, 26 de maio de 2017

"Árvore com olhos" e a jovem exploradora chinesa

As árvores com "olhos"
Por Levi Jucá.

O espírito investigativo do Jovem Explorador esteve mais presente do que nunca durante a nossa estadia na China, em dezembro de 2016. A viagem, em si, já significava uma experiência incrível. Saímos de Pacoti até o outro lado do mundo para participar da Be The Change (BTC), conferência do movimento global Design For Change que, no Brasil, é representado pelo Criativos da Escola (Instituto Alana – SP), cujo Desafio conquistamos em 2015. Além da grande oportunidade de compartilhar nosso projeto junto a crianças, jovens e educadores critativos de todo o mundo, nada passava despercebido de nossa curiosidade multiplicada pelo choque cultural que experimentamos a cada instante daqueles dias inesquecíveis.

Ao chegarmos na Daystar Academy, escola que sediou o evento em Pequim (Beijing), as árvores que circundavam seus muros chamavam bastante a atenção. Não pelo verde das folhas, inexistente naquele período de inverno abaixo de zero (- 3º C), mas pelo aspecto curioso dos caules finos, esbranquiçados e, com olhos! Sim! Marcas escuras (de galhos já caídos) cujos desenhos, sem exceção, simulam olhos humanos. Nos dias seguintes, em passeios pela cidade, notamos que essa espécie era muito utilizada na arborização urbana, reinando com larga vantagem nas calçadas, canteiros, praças e bosques.

Muitos "olhares" no entorno da escola e em toda Pequim.
Desde então não esperei por sair perguntando qual o nome daquela planta aos organizadores do evento, estudantes e, principalmente, para o nosso intérprete (que era chinês!). E, para minha surpresa, ninguém sabia responder. Faziam cara de dúvida, olhavam e respondiam algo assim: “Como eu não sei disso?!”. Qualquer semelhança com o que também ocorre por aqui não seria mera coincidência. Afinal, tudo o que nos parece comum, aquilo que com que nos deparamos rotineiramente, não desperta importância, nosso olhar. É exatamente para esse fato que alertamos e discutimos no curso das atividades de pesquisa do Ecomuseu.


Foi por tudo isso que, três dias depois, tive uma ideia para resolver o caso. Convoquei uma chinesa para ser jovem exploradora por um dia, desafiando-a a descobrir não apenas o nome da árvore (científico e popular), mas sua história (algo me dizia que aqueles olhos guardavam uma lenda, mito...). A escolhida foi a simpática Wei Yun (fala-se “Uêi Ouâm”), acadêmica de língua inglesa e orientadora voluntária responsável por nossa delegação brasileira.  Ela topou responder um questionário que elaborei em inglês sobre a planta misteriosa e foi à campo pesquisar!

"The Challenge" sobre o mistério da Árvore com Olhos!

Transcrevo e traduzo, a seguir, o que ela me devolveu ao final do dia:

Nome Popular:  桦树 (Baihua Shu = bétula ou vidoeiro branco)
Nome Científico: Betula platyphylla
História:  na antiga China, havia uma menina que estava sempre à procura de um amante. Depois que ela morreu, ela tornou-se uma árvore com os olhos para continuar a procurar seu amante para sempre. A Bétula é a árvore nacional da Rússia, representando o espírito nacional de vitalidade.

Wei Yun, a jovem exploradora chinesa que aceitou o desafio!
Resolvido o problema, procuramos saber mais. Coincidentemente, uma variação de seu nome científico seria Betula pendula, cujo termo de “espécie” é o mesmo de Parkia pendula, nosso visgueiro, símbolo do Ecomuseu de Pacoti. Também conhecida como bétula branca japonesa ou bétula de prata da Sibéria, pode ser encontrada em outros lugares temperados da Ásia como Japão, Coréia e Sibéria, alcançando entre 20 a 30 metros de altura. Sua casca é amplamente comercializada para fins medicinais (desintoxicação, antitussivo, diarréia aguda e crônica, asma, etc.), nas práticas tradicionais do Oriente.


A exemplo da velha lenda, estamos sempre em busca: pelo amor ao conhecimento! Provando que somos jovens exploradores (e educadores) aqui e até na China, registramos a sensível experiência de se deixar levar, literalmente, pelo misterioso olhar de uma árvore...

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Ecomuseu de Pacoti: em vista acervo inédito sobre a Serra de Baturité e o Ceará do século XIX.


Você já imaginou ver fotografias da Serra de Baturité produzidas no século XIX?
Projeto de pesquisa em patrimônio cultural de ciência e tecnologia faz parceria com o Ecomuseu de Pacoti para a recuperação de documentos inéditos envolvendo a Serra de Baturité - CE. Manuscritos e fotografias produzidas pelo botânico suíço Jacques Huber que esteve na região em 1897.

Dezembro/2016.

Jovens Exploradores de Pacoti vão refazer os passos de Jacques Huber

O Museu de Astronomia e Ciências Afins - MAST, instituto de pesquisas do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação realizou, entre 05 e 08 de dezembro de 2016, o IV Seminário Internacional Cultura Material e Patrimônio de Ciência e Tecnologia (IVSPCT), na cidade do Rio de Janeiro - RJ. O evento foi aberto a todos aqueles interessados na preservação, documentação e uso do patrimônio cultural de Ciência e Tecnologia / C&T.

No curso da programação, o projeto "Jovem Explorador e o Ecomuseu de Pacoti" foi apresentado na fala do Prof. Dr. Nelson Sanjad (Museu Goeldi - Pará), participante da Mesa Redonda do dia 08 de dezembro, cujo tema era "Museus e a Preservação do Patrimônio de C&T", juntamente a Marcio Rangel (MAST), Aline Rocha de Souza F. de Castro (Museu da Geodiversidade/UFRJ) e Maria Esther Valente (MAST).

Mesa Redonda "Museus e a Preservação do Patrimônio de C&T"
Foto: Cortesia do Museu de Astronomia e Ciências Afins/MCTIC.

Tratando de sua pesquisa sobre a vida e a obra do botânico suíço Jacques Huber (1867-1914), Sanjad relatou a vinda do cientista à região da Serra de Baturité, na qual realizou estudos, coletas e registros fotográficos no século XIX. O pesquisador conheceu a proposta do Ecomuseu de Pacoti durante sua participação no Congresso de História da Educação do Ceará (UFC), em setembro de 2016, em Fortaleza - CE.

No final da apresentação, foi apresentado um dos desdobramentos do projeto de pesquisa e documentação em curso no Museu Goeldi, desenvolvido em parceria com o Ecomuseu de Pacoti, sob a orientação do Prof. Levi Jucá. Esse subprojeto tem por finalidade o estudo, acondicionamento, digitalização, transcrição e tradução de documentos relacionados com uma expedição que Jacques Huber realizou ao estado do Ceará em setembro e outubro de 1897. O legado dessa expedição reúne um diário, um caderno de campo, cerca de 50 fotografias, além de uma coleção botânica, atualmente preservada no Museu Goeldi, no Jardim Botânico de Genebra, na Universidade de Montpellier e no Museu Nacional de História Natural de Paris.

Nelson Sanjad
Foto: Cortesia do Museu de Astronomia e Ciências Afins/MCTIC.

O projeto Jovem Explorador, que concebeu a proposta do Ecomuseu, foi inspirado Imperial Comissão Científica, chefiada pelo botânico Freire Alemão, que veio ao Ceará em 1859. E, por isso, tem por objetivos principais incentivar a iniciação científica de jovens estudantes, assim como divulgar o patrimônio cultural e natural. Assim, é intenção da parceria divulgar esse material por meio de publicações e ações educativas envolvendo Pacoti, Guaramiranga e toda a região serrana e sertaneja, na qual Huber esteve em trabalhos de campo.

Jacques Huber
Saiba mais sobre a pesquisa:

De Basileia a Belém: a carreira transnacional do botânico Jacques Huber (1867-1914)
Por Nelson Sanjad

O botânico suíço Jacques Huber é amplamente reconhecido como pioneiro da pesquisa tropical. Sua obra abrange a taxonomia, biogeografia, ecologia e agronomia. Antes de migrar para Belém, estado do Pará, em 1895, Huber estudou na Basileia (1884-1889) e trabalhou em Montpellier (1889-1893) e Genebra (1893-1895). Em sua pesquisa, ele mudou dos estudos sobre algas e liquens mediterrâneos e alpinos, que desenvolveu na Europa, para plantas amazônicas, especialmente árvores frutíferas, madeireiras e gomíferas - e suas associações. Embora ele tenha mudado seus objetos de investigação devido a demandas políticas, a abordagem teórica de Huber permaneceu a mesma, fortemente ligada à fitogeografia e sociologia vegetal que se desenvolveram na Basileia, Montpellier e Genebra nas últimas décadas do século XIX.

A excepcional produção científica de Huber - incluindo uma extensa obra fotográfica - apresenta, em essência, o primeiro olhar ecológico sobre a floresta amazônica. Isso atraiu a atenção de cientistas de todo o mundo e resultou em uma ampla correspondência c om colegas das Américas, Europa e Ásia sobre a Amazônia, sua biodiversidade, processos ecológicos, economia e representações iconográficas. Nesse sentido, a carreira transnacional de Huber e sua obra multi-dimensional, a qual combina diferentes objetos de investigação, ciência e arte, projetos de pesquisa e desenvolvimento, podem contribuir para a discussão sobre complexos assuntos relacionados com a interface entre ciência local e global, com a circulação e tradução de conhecimentos nativos e científicos, e com a relação entre ciência e política em contextos locais, nacionais e internacionais.